segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Ahab e a cabeça da baleia


“Fala, estraordinária e venerável cabeça”, murmurou Ahab, “que embora não agraciada com barbas, aqui e ali apresentas o musgo respeitável; fala, cabeça poderosa, conta-nos o segredo que guardas em ti. De todos os mergulhadores, tu mergulhaste mais fundo. Essa cabeça, sobre a qual o sol lá em cima brilha, moveu-se pelas fundações deste mundo. Onde nomes e navios esquecidos enferrujam, e esperanças e âncoras perdidas apodrecem; onde, em seu porão de morte, a nau terra encontra lastro nos ossos de milhões de afogados; ali, naquele terrível mundo aquático, ali era a tua moradia mais corriqueira. Estiveste onde sino e mergulhador jamais estiveram; dormiste ao lado de muitos marinheiros, onde mães insones teriam dado a vida para repousar. Viste os amantes abraçados saltando do navio em chamas; quando o céu lhes parecia falso. Viste o oficial assassinado, quando lançado do convés pelos piratas à meia-noite; durante horas caiu na mais profunda meia-noite de sua goela insaciável; e os assassinos continuaram navegando incólumes – enquanto raios velozes destroçavam o navio vizinho que podia estar trazendo um marido fiel para braços abertos e ansiosos. Ó, cabeça! Viste o suficiente para apartar os planetas e tornar Abraão descrente, e nem uma sílaba escuto de ti!”
Herman Melville, Moby Dick, capítulo 70, "A esfinge". Leitura em andamento.

2 comentários:

maikel rosa disse...

Fui só eu que vi sacanagem nesse trecho?

Samir Machado disse...

Se foi pelo "dormiste ao lado de muitos marinheiros", acho que era mais uma metáfora pro sono da morte, ehehhehehehehe.

Mas acredite, homoerotismo é o que não falta no livro. Principalmente na relação Ishmael / Queequeg.

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